Estou a ler um ensaio filosófico muito
bom: “Passeios Filosóficos” de Jean-Yves Mercury. Um texto rico sobre os pontos
invisíveis da vida que nos ultrapassa pelas circunstâncias actuais; o frenético,
a monetarização da vida quotidiana, o de ter em vez do ser, etc; são questões
que fazem parte da essência da vida e do prolongamento da nossa existência. Este
é um aparte.
Nesta nota solta, corriqueira da deriva do
inconveniente, traz-nos lembranças e sorrisos malandros. Quem não se lembra dos
quadros da vida feitas de imaginações que nos apoquentava, enobrecia nas nossas
esteiras e mundos imaginários, estórias contadas que ficavam nas fronteiras dos
nossos bairros e casas… eram estórias, por isso imaginárias, que floresciam nas
tramas da vida quotidiana que alegravam miúdos e graúdos… por causa dessas
estórias não fazíamos muitas coisas, não saiamos às ruas com medo de monstros,
finados, entre outros seres imaginários. Essas estórias, naquele momento, exercia
controlo social no seio da comunidade; nos seus traços imaginários apertavam os
nos da coesão colectiva.
Os seres povoavam o nosso imaginário,
pareciam caleidoscópio de figuras-actores que entravam nas nossas casas. O Ti
Lobo, Xibinho, Tia Ganga, Bocage, os três manos (Pedro, Paulo e Manuel) não
eram outras coisas do que livros, romances da vida, alimentadas nas narrativas
onde se pretendia encontrar a moral da estória. A moral da estória era o anel
da descoberta. Essas imaginações eram eficazes naquele momento; os contadores faziam
o trabalho do Estado; eram os nossos tutores da vida; Ensinava-nos a agir
perante a lei, à sermos bons cidadãos, à ajudar os próximos, etc. Nas nossas
cabecinhas pareciam reais… mas eram o encantamento da vida.
E agora? Os nossos contadores de estória,
os nossos tutores da vida, faleceram todos; nos baús da memória fugiram e
cristalizaram em corpos reais. O mito morreu! A memória colectiva morre em cada
momento em qua há renovação de gerações; os media e a globalização completam o
processo. Na dinâmica entre a lembrança e o esquecimento, o esquecimento vence
sempre. E o Estado, onde anda?
Agora, vejo os Ti Lobo, Xibinho, Tia
Ganga, Bocage, nas nossas cidades e bairros. O Ti Lobo, os políticos e quadros
do sistema; Xibinho anda petrificado e incapaz! A Tia ganga: roubada e violada
em cada instante! O Bocage transita com a sua inventona no palco da urbe, cada
momento exerce a sua especialidade: gamanço yeah!
Agora, vejo mais outra estória: a pós-modernidade trouxe os rabelados à
ribalta com as suas estórias. A educação artística mostra-nos o que os
apoquentavam; porque é que não faziam parte do discurso da nação; o porque da
invisibilidade… nos seus quadros de vida
povoam figuras, medos e reflexibilidade sobre a inclusão no panorama nacional.
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